sábado, 30 de março de 2019

FEZ ZUADA NO SERTÃO


FEZ ZUADA NO SERTÃO
Lá pra umas bandas do sertão, também conhecida de Caatinga, o cabeça-vermelha estava totalmente desorientado, voando de um lado para outro, parecendo que tinha visto uma assombração. Esse belo passarinho em desespero era conhecido por seus amigos como Tino, e voar sobre o sertão, observando tudo o que acontecia, era o que ele mais gostava.

Parando um pouco para descansar, Tino pousou em um pé de umbu e ali debaixo, comendo as frutas caídas no chão, estava o seu Mocolino, um mocó bom de conversa, renomado na região pelos seus belos cordéis.

Vendo o cabeça-vermelha todo ofegante e com cara de quem tinha visto assombração, perguntou:

- Que desespero é esse companheiro, sentou no formigueiro? Ou comeu fruta estragada? Tá com diarreia meu camarada?

Tino ainda ofegante começou a falar:

- Oxente seu Mocolino, nada disso e nem são horas para brincadeiras! É que voando pelo sertão avistei monstros gigantes de 3 braços, que estão invadindo nossas terras. Eles são bem grandes, grandes mesmo e ficam com os braços girando quase o tempo todo.

- Rapaz, monstros gigantes, de 3 braços, girando quase o tempo todo, tu achas que sou tolo? Só falta tu me dizer que eles devoram criancinhas inocentes e capturam velhinhas sem dentes.

E o seu Mocolino caiu na gargalhada: kkkkkkkkkkkkkkkkkkkk...

Tino, magoado pelo deboche do mocó, bateu asas em retirada e foi procurar outro bicho que acreditasse no que ele tinha visto.

Perto de umas pedras, pronta para dar um bote no grilo, estava a dona Corrinha, uma cobra que não dispensava uma boquinha.

Mas com a chegada repentina de Tino, dona Corrinha se distraiu e perdeu de vista o seu almoço.  Ficou toda aperreada e já foi logo reclamando:

- Oh seu desmantelado! Tu acaba de atrapalhar o meu almoço. Logo hoje que eu tinha encerrado o meu regime. Tá de brincadeira? Tá de brincadeira?

- Me perdoe dona Corrinha, mas é que todos nós estamos em perigo. Logo seremos atacados pelos monstros de 3 braços. Estamos em perigo! Estamos em perigo!

- Monstros de 3 braços? Que doideira é essa? Tá ficando doido é? Tá ficando abestalhado é?

- É sério. Juro que estou falando a verdade.

- Nãmmmm! Que história é essa, não vou cair na sua pegadinha. Já sou bem grandinha para acreditar em histórias de monstros. Ainda mais em monstros de 3 braços. Me poupe! E vê se não me atrapalha mais na hora do meu almoço. Tá entendendo?

Como a dona Corrinha não quis mais conversa, Tino ficou chateado e bateu asas em retirada, saiu sem rumo e sem saber se alguém acreditaria no que ele tinha visto.

Voando mais a frente, em uma parte de mata mais fechada, Tino viu um bando de macacos-pregos pulando de galho em galho fazendo muito barulho. Tino preferiu não se aproximar. Mais  curtidores do que esses macacos, no sertão não existia. Se o seu Mocolino e a dona Corrinha não acreditaram, com toda certeza a turma dos macacos também não acreditariam.

Se sentindo sem credibilidade para falar o que tinha visto, Tino preferiu não contar mais nada, mesmo tendo visto pelo sertão outros bichos como: cachorro do mato, sapo-cururu, calango-verde, teiú, cobra-de-duas-cabeças, coruja-buraqueira, quero-quero, jaritataca, saguis, bando de arribaçãs, anu-branco, gato-mourisco e tantos outros.

Até que mais frente, empoleirado em uma cerca, estava o seu Zeca, um urubu-de-cabeça-amarela, olhando para o horizonte todo preocupado. O pequeno cabeça-vermelha pousou ao seu lado e puxou conversa:

- Tudo bem seu Zeca? Tu tá muito agoniado? Aconteceu alguma coisa?

- Não. Não está nada bem. Estamos com um problema. Um problema grande. Um problema bem grande, um problema do tamanho do sertão.

- Oxente! Pois me diga! É um problema bem grande mesmo. Pelo jeito bem mais problemático do que os monstros de 3 braços que eu avistei hoje de manhã.

- Tu também viu Tino? Tu viu aquelas coisas? O que faremos agora? Já não bastava termos esses tempos de seca, com pouca chuva, e agora temos que enfrentar aquelas coisas gigantes. Eu fiquei observando de longe, mas deu pra perceber que é mais uma invenção dos humanos, inventaram aquelas coisas gigantes para tomar o nosso sertão, a nossa casa, o nosso lar.

E o seu Zeca se pôs a chorar: Buá, buá, buá...

Mas Tino, com um tom de animação, teve uma ideia:

- Calma seu Zeca! Ainda não é o fim de tudo. Vamos dar um jeito. Vamos convocar uma reunião extraordinária nível máximo com toda bicharada e vamos enfrentar aqueles monstros de 3 braços. Não daremos por vencidos tão facilmente.

O seu Zeca concordou com a ideia. E os dois foram juntos cumprir essa missão: juntar a bicharada para uma reunião e decidirem como enfrentar os monstros de 3 braços dos humanos.

Com a notícia espalhada por toda o sertão, não demorou muito para juntar toda a bicharada em uma área aberta, com mandacarus, quina-quina e xique-xiques em volta.

Tino empoleirou em um mandacaru e falou alto para todos ouvirem.

- Minha gente, todos já sabem dos monstros gigantes de 3 braços que estão invadindo nosso sertão. Também já sabemos que são os humanos que trouxeram aquelas coisas para cá. Nós não permitiremos que essas coisas tomem nossos poleiros, nossas tocas, nossas matas. Esse é o nosso lar, é a nossa casa. Quem está comigo? Quem está comigo?

E a bicharada começou a gritar, como se estivessem prontos para guerra. Pois estariam defendendo o que eles tinham de mais precioso: o sertão que era a sua casa.

Quando de repente! Quando der repente! Quando de repente! Só mais uma vez. Quando de repente! Um bicho que era difícil de se ver no sertão apareceu. Muitos achavam que nem existia, mas apareceu na reunião da bicharada e pediu para falar:

- Calma gente! Pra quê essa zoada toda? Não é bem isso que estão pensando. Não estamos perdendo nossas casas, podem ficar tranquilos.

Esse sujeito que apareceu, querendo acalmar todo mundo era o Muça, um jaboti-d’água, um bicho pequeno que fica quase o tempo todo escondido. É daqueles que prefere ficar sozinho. E gosta de uma boa soneca. De manhã, de tarde e de noite.

- Meu povo, vou explicar o que são aquelas coisas. Que para começar não são monstros. São máquinas. Os humanos chamam de aerogeradores, e como todos sabem, nesse lado do sertão venta muito, e por causa desse vento, aqueles braços, que os humanos chamam de pás aerodinâmicas, giram e produzem energia elétrica. É uma forma que os humanos encontraram para produzir energia elétrica causando menos danos no meio ambiente. Eles chamam de energias renováveis. Fiquem todos sossegados. Todos estão seguros, são e salvos.

E em um grande coro, a bicharada fez um:

-Aaaaaaahhhhhhh!

Então Tino falou:

Oxente! Se é assim, não precisamos enfrentar aquelas coisas. Que bom! Sou contra qualquer tipo de violência. Meu lema sempre foi paz e amor! Mas me diga Muça, como tu soube de tudo isso?

O Muça esclareceu:

- Bom, eu estava lá por perto, quando as construções começaram. No início também fiquei com medo e então me entoquei debaixo de uma pedra.  E entre uma soneca e outra, por alguns dias, fiquei ali, entocado, observando e escutando tudo que os humanos falavam.

Então o seu Zeca perguntou bastante encabulado:

Oxente! E desde quando tu entendes a língua dos humanos?

O Muça já fazendo bocejo, respondeu:

- Num sei, só sei que foi assim!

FIM

Autor: Julimar Andrade Oliveira








domingo, 3 de março de 2013

Cordel do calango


Meu nome científico é Tropidurus oreadicus
Calango ou Labigó, qualquer nome podem me chamar
Um lagarto encontrado em várias partes do Brasil
Não precisa andar muito para me encontrar


Faço morada em muitos lugares
Subo em árvores e também vivo no chão
Muitas pessoas não gostam da minha presença
Que besteira!
Ter por mim, tamanha repugnação.


Normalmente me alimento de insetos
Certas populações ajudo a controlar
Por isso, gostaria humildemente que reconhecessem
A minha importância na cadeia alimentar.



sábado, 16 de fevereiro de 2013

Lágrimas de crocodilo

Por acaso você já ouviu em algum lugar a expressão popular “derramar lágrimas de crocodilo”? 

Essa expressão é usada para dizer que alguém chora sem razão ou por fingimento, surgindo de um fato que acontece com os crocodilos.

Quando o crocodilo come uma presa, ele a engole sem mastigar. Para isso, abre a mandíbula de tal forma que ela comprime a glândula lacrimal, localizada na base de seu olho, o que faz com que esses répteis lacrimejem. 


Esse está com cara de político!


São lágrimas naturais, mas é lógico que não significam que o animal se emocione ou sinta pena da sua presa. Daí vem a expressão "lágrimas de crocodilo", querendo dizer que, embora a pessoa chore, suas lágrimas não significam que ela esteja sofrendo, e por muitas vezes é por pura falsidade. 

Os crocodilianos são animais visados para obtenção de carne e couro. Provavelmente você já deve ter ouvido falar de como é valioso um sapato ou uma bolsa feita com pele de jacaré. A carne de jacaré também é muito apreciada por muitas pessoas do mundo inteiro. Quem já teve a oportunidade de ver um jacaré, mesmo que longe, deve ter notado um animal aparentemente tranquilo, mas que pode ser muito perigoso. 
Apesar de serem raros os ataques do jacaré a seres humanos, grande jacarés como o jacaré-açu (Melanosuchus niger) podem alcançar seis metros de comprimento e por isso, são temidos pelas pessoas. 

Com seis espécies, o Brasil é um dos países que apresenta maior riqueza desse grupo, com quatro delas ocorrendo na Amazônia. 

Os nomes populares são: jacaré-de-papo-amarelo (Caiman latilostris), jacaré-do-pantanal (Caiman yacare) jacaretinga (Caiman crocodilus), Jacarepaguá (Paleosuchus palpebrosus), jacaré-coroa (Paleosuchus trigonatus) e jacaré-açu (Melanosuchus niger). 



Caiman crocodilus crocodilus (jacaré-tinga)


Os jacarés são carnívoros, mas nem por isso saem devorando pessoas como muitos pensam. Para atacar, o jacaré tem que se sentir muito ameaçado, pois, do contrário, ele afunda podendo ficar debaixo d’água por mais de dez minutos sem respirar. 

Os jacarés são animais fascinantes e merecem todo respeito por ser um predador natural e ajudar no equilíbrio populacional de peixes nos rios. 

 

sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

A cobra que mama

Você já deve ter ouvido falar sobre a lenda que diz que a caninana (Spilotes pullatus) ou outra cobra é capaz de mamar numa mulher lactante enquanto mantém a ponta da cauda na boca do bebê, para este não chorar. Se nunca ouviu falar dessa história quero apresentar mais uma de tantas lendas que envolvem as cobras.

Para ficar claro que essa história não é verdadeira, é constatado pelos Biólogos que o formato da boca da serpente não é adequada para amamentação , e que o leite não faz parte de sua alimentação. A origem dessa lenda pode estar associada ao encontro de serpentes em currais, na hora da ordenha – serpentes que provavelmente estavam a procura de roedores ou de proteção, mas pessoas associam com as vacas leiteiras e a ordenha. 

A caninana (Spilotes pullatus) também tem fama de cobra brava, que corre atrás e alguns dizem que ela é extremamente perigosa, porém tudo não passa de uma fama injusta. Mesmo sendo grande e de achatar o pescoço quando está irritada, a Caninana é uma cobra mansa e sempre foge quando avistada. Eu mesmo já tive essa experiência  em um trabalho que fiz. Quando me deparei com uma caninana, que tinha aproximadamente dois metros, ela simplesmente fugiu sem me deixar tirar pelo menos uma foto. É importante ficar claro para o leitor, que essa cobra como a maioria de todos os animais, pode atacar caso ela se sinta ameaçada. 

A caninana (Spilotes pullatus) não é uma serpente peçonhenta podendo atingir 3,0 m de comprimento total. Possui colorido de fundo negro com barras amarelas e ventre manchado de amarelo. Alimenta-se de lagartos, aves, ovos e mamíferos (Freitas, 2003), e não de “leite” como relatado na lenda. Esta espécie é considerada comum, sendo amplamente distribuída nas Américas Central e do Sul em todos os ambientes.

Spilotes pullatus (Caninana)

As serpentes predam vários grupos animais, sendo este fenômeno o principal eixo do nicho ecológico desses animais. Todas as espécies são carnívoras que engolem suas presas inteiras e podem caçar em vários ambientes (aquático, subterrâneo, terrestre e arbóreo). As serpentes podem ser pequenas, ou atingir até mais de nove metros de comprimento, como no caso da sucuri (Eunectes murinus), mas a maioria das espécies não ultrapassa dois metros.

Os répteis apresentam o corpo recoberto por escamas, com poucas glândulas na pele, estando melhores adaptados para a vida terrestre do que os anfíbios. As serpentes estão entre os animais mais temidos e odiados pelas pessoas em geral devido à periculosidade de algumas espécies. Mesmo assim, precisamos reconhecer a importância ecológica das serpentes para a natureza e para o homem. Vários laboratórios internacionais que usam o veneno de muitos tipos de serpentes para fazer diversos medicamentos.

A maioria das serpentes utiliza a fuga para escapar dos predadores (inclusive do homem) ou fica parada para não ser percebida. Algumas serpentes, peçonhentas ou não, quando se sentem ameaçadas podem aplicar botes para atacar o agressor. Caso você se depare com alguma serpente, peçonhenta ou não, é importante que não a mate. Basta ligar para o Corpo de Bombeiros (193) que eles virão para fazer a captura e soltá-la em seu habitat natural.  


 

O sapo leiteiro

Lendas e crendices habitam o imaginário de muitas pessoas há muito tempo e os animais são personagens de várias. Os anfíbios são animais representados pelos sapos, rãs, pererecas e salamandras e por vezes, estes animais sofrem com o preconceito e antipatia pela grande maioria das pessoas.  

O nome anfíbio provém do grego (amphi = duplo; bio = vida) e se deve ao fato de grande parte das espécies apresentar uma fase larval aquática na forma de girino (com respiração branquial e, em sua maioria, alimentação herbívora) e outra fase terrestre, adulta, com respiração pulmonar e cutânea e alimentação baseada principalmente em artrópodes.  

O sapo-cururu (Rhinella schneideri, Rhinella marina, Rhinella icterica) é muito comum por aparecer nos quintais das casas, nas ruas, ou em brejos podendo causar desconforto ou até mesmo pavor para muitas pessoas que o observa.
  
Rhinella schneideri (Sapo-cururu)

A crença que os sapos esguicham veneno nos olhos das pessoas vem passando de gerações em gerações, mas as verdades dessa história poucos conhecem. Tenho certeza que você já deve ter ouvido alguém falar pra tomar cuidado com os sapos porque eles jogam leite podendo até cegar. 

Eu particularmente, durante a minha infância, já vi muita gente matando sapo a pedradas ou a pauladas por acreditar mesmo nessa história. Ou ainda, jogando sal em suas costas deixando-o com muita dificuldade em respirar. Mas será mesmo que sapo joga leite? Ou ainda, será que o sapo produz leite assim como as vacas?

Vamos por parte!

A vaca é um mamífero. Os filhotes (bezerros) das vacas necessitam de leite materno no início da vida.

Você já viu filhote de sapo mamando?

Sapo é mamífero? Com certeza não!

Os sapos fazem parte do grupo dos anfíbios e não produz leite. Aquele líquido branco-amarelado parecido     com a textura do leite que você deve ter visto algum dia, é apenas uma secreção composta por toxinas que funcionam como mecanismo de defesa contra possíveis predadores.

Pois bem, existe um grande equívoco por acreditar que os sapos tenham a capacidade de esguichar “leite” nas pessoas. Mas quero apresentar-lhes uma espécie que tem a capacidade de esguichar uma pequena quantidade de secreção tóxica, e não “leite”, á uma distância de 2 m, aproximadamente. Conhecido popularmente como "sapo" o Rhaebo guttatus de forma voluntária é capaz de ejetar veneno com suas glândulas paratóides. 

Rhaebo guttatus (sapo)

A espécie Rhaebo guttatus apresenta hábitos noturnos e é encontrada em todo o norte do Brasil, correspondendo toda a região amazônica (Frost, 2011). 

A capacidade de esguichar veneno desse sapo só pode ser observada em indivíduos adultos e quando se sentirem ameaçados. É bom deixar claro para os leitores que esse comportamento não é uma regra, pois alguns estudos demonstram que o Rhaebo guttatos pode apresentar diversos tipos de mecanismos de defesa, como: permanecer imóvel, fugir, inflar, urinar, abrir a boca e fechar rapidamente e repetidamente e ainda inclinar o corpo. 

A crença de que os sapos jogam leite tem fundamento, assim como muitas outras lendas e crendices. Por isso é importante que pesquisas científicas com estes e outros tantos animais aconteçam. Muitos Biólogos estão nessa jornada em procura de entendimento e respostas para tantas questões que se não forem estudadas, acabam virando crendice ou lenda. 

Você pode até não gostar dos anfíbios, mas é obrigado reconhecer a importância que estes animais têm na natureza. Não mate e não maltrate os anfíbios, pois a existência desses animais beneficia e muito a vida de nós seres humanos.